A 19.ª Cimeira Ibero-Americana. E Portugal?

01-04-2011 12:20

Realizou-se no Estoril, arredores de Lisboa, no passado dia 30 de Novembro e dia 1 de Dezembro, a 19.ª Cimeira Ibero-Americana.

Para quem teve a oportunidade de acompanhar uma pequena etapa dos trabalhos na manhã do dia 1 de Novembro pode testemunhar a forma, algo informal e em directo, em como decorreu uma parte da sessão durante a qual se fecharam algumas negociações e foram tomadas algumas decisões.

Ao escrever este texto e observando em simultâneo o mapa-mundo e a localização dos países ibero-americanos posso ser tentado a procurar interpretar e reflectir sobre as relações económicas entre Portugal e estes países. O potencial existente ao nível da cooperação económica, do comércio internacional, do crescimento de negócios com vantagens mútuas do ponto de vista económico entre todos os países participantes é imenso. A posição geo-estratégica de Portugal como porta de entrada numa Europa ainda à procura do seu próprio espaço, único, coerente, integrado e de uma só voz (que tem sido difícil de alcançar) poderá ser essencial para virmos a desempenhar um papel fundamental na relação com estes países. Portugal não soube aproveitar ainda as oportunidades que uma forte cooperação comercial e económica com estes países lhe pode proporcionar nem a riqueza de uma língua que, sendo diferente, pode ser no entanto considerada como uma língua irmã.

Sempre defendi a adopção de uma política estratégica internacional desenvolvida através de Portugal (como eixo central) para a América Latina (em especial com o Brasil) com a Europa Comunitária onde estamos integrados não só geograficamente mas como membros de pleno direito, reféns em parte de uma política económica (e dependência financeira) quase comum, e tendo como terceiro eixo a África Lusófona.

Este terá que ser o caminho. Já antes havia expresso esta convicção em alguns textos publicados em 2003 após ter assistido a uma conferência em Portugal onde esteve presente o Presidente brasileiro Lula da Silva e depois de desempenhar funções profissionais no contexto da África Lusófona. Sei que esta é também uma ideia defendida por alguns outros observadores da política externa portuguesa.

As relações económicas com o Brasil e com a Venezuela não são de hoje, vêm de há muitas décadas e muito antes de se falar da integração de Portugal neste eixo e do advento da globalização.
Esta é uma linha estratégica que nos pode favorecer como país atlântico, se o soubermos aproveitar com visão de futuro.

Gostaria de salientar que mantenho a convicção, tal como em 2003, que parte do nosso caminho de futuro se deve direccionar para o Brasil.

É verdade que o Brasil pouco precisa de Portugal, pela sua dimensão enquanto país para além de uma dimensão económica tal qual a conhecemos. Mas precisa. Relembremos investimentos nacionais que hoje são relevantes de grandes grupos empresariais nacionais como a PT, a Cimpor, o Grupo de Pereira Coutinho, Espírito Santo, Champalimaud ou ainda o Grupo Pestana, só para falar de alguns. Estes fazem parte dos grandes investimentos estrangeiros no Brasil, os quais o Brasil agradece. Ainda para mais investimento que fala português e que mais vantagens lhes trará em termos da criação de emprego local. E estes mantêm-se com sucesso. E podem, se bem visionados e com espírito de cooperação, ajudar à transferência de outros projectos de empresas nacionais mais pequenas que poderão utilizar estas âncoras para também elas investirem neste país. Negociar com este país não é, apesar de tudo, fácil. O Brasil apenas reviu a sua rota de cooperação internacional a nível político e empresarial e mostrou uma muito maior abertura ao exterior na era Lula, não antes, quando estava fundamentalmente virado para os Estados Unidos da América.

Há no entanto alguns cuidados e sinais a observar. Relembro por exemplo o que disse muito recentemente Paul Krugman, economista americano vencedor do Prémio Nobel da economia do ano passado, quando desconfia da pujança actual do Brasil (não é o caso do autor deste texto) ao afirmar que o perigo está eminente uma vez que «os investidores estão a gostar demasiado do Brasil» - SIC.

Mas sendo o líder mundial na produção de petróleo em águas profundas, o Brasil descansa hoje sobre uma almofada confortável para os próximos anos (ainda que  não se sabendo quantos) em especial se considerarmos que as maiores jazidas futuras de petróleo estão, a maioria delas, em águas profundas. Isto para não falar da produção de café, de gado ou de açúcar onde são igualmente líderes mundiais. Deveremos também não esquecer o valor da nossa língua (a mesma) um dos mais fortes valores/activos da Nação, falada por mais de 200 milhões de pessoas. Esta será sempre a mais forte âncora entre dois ou mais países.

Quanto à Venezuela, diria o seguinte: Portugal não regista relações comerciais de qualquer significado com o Paraguai, o Uruguai, a Argentina, o Chile ou a Bolívia, para referir apenas alguns exemplos de países da América Latina. Porém, o mesmo não se aplica à Venezuela pois Portugal tem neste país um dos seus principais fornecedores, há muitas décadas, do petróleo que consumimos.

A história da Venezuela não começa nem acaba com Hugo Chavez. Se é verdade que hoje é um país refém de uma certa democracia à moda do terceiro mundo, o país não se confina à realidade de hoje mas também à de ontem e de amanhã. Chavez passará e o movimento de nacionalizações acabará. Assim os Venezuelanos acordem a tempo. O que importa é manter boas relações com o mundo empresarial que darão certamente frutos no futuro. Existem casos (poucos é verdade) de empresas portuguesas que têm parcerias com empresários locais e que há mais de uma década deixaram no país o registo de um bom trabalho as quais estão hoje a ser de novo contactados para novas parcerias, novos trabalhos e novos projectos. Não se esqueceram de quem trabalhou bem! É disto que falo. Semear hoje para colher amanhã. E acredito que o caminho estará por aí.

 

Mário de Jesus

FRES - Fórum de Reflexão Económica e Social